O jovem Ícaro, na mitologia grega, era o filho de Dédalo e é comumente conhecido pela sua tentativa de deixar a ilha de Creta voando. O final desta história muitos conhecem, mas afinal o que nos diz esta passagem da mitologia grega? Vamos refletir sobre os sujeitos Ícaro e Dédalo.

Famoso inventor e construtor da Grécia antiga, Dédalo era um gênio muito procurado por suas habilidades. Talvez a mais famosa de suas construções e projetos tenha sido o labirinto do Minotauro. Originalmente encomendado pelo Rei Minos da ilha de Creta, o labirinto foi arquitetado por Dédalo para manter o Minotauro preso, uma criatura mitológica metade homem e metade touro. Após a morte do Minotauro, Dédalo ficou preso, juntamente a seu filho, no labirinto. Então construíram asas artificiais a partir da cera do mel de abelhas e penas de pássaros de diversos tamanhos, moldando-as com as mãos para ficarem como asas de verdade. Dessa forma, Dédalo conseguiu fugir, antes, porém, alertou o filho que não voasse muito perto do Sol, para que não derretesse a cera das asas, e nem muito perto do mar, pois esse poderia deixar as asas mais pesadas. No entanto, Ícaro não ouviu os conselhos do pai e tomado pelo desejo de voar próximo ao Sol, acabou por cair no mar Egeu, e se afogou na área que hoje leva seu nome, o Mar Icariano, perto de Icaria, uma ilha ao sudoeste de Samos. 

Se o mito realmente aconteceu, nunca saberemos. A interpretação por detrás desta história permite refletir que Ícaro, jovem, imaturo, teimoso e valente aventurou-se próximo ao Sol e, pagou o preço com sua vida. Contrariando Dédalo, mestre, astuto, conservador e experiente. Fazendo uma analogia com nossa sociedade humana, podemos dizer que a teimosia dos mais jovens ao contrariar os mais velhos, e mais experientes, pode trazer resultados ruins, assim como almejar objetivos grandes, sem ter os meios de se chegar até lá.
Será??
Nas áreas cirúrgicas, especialmente em neurocirurgia, a figura quase patriarcal do mestre e aquela do aprendiz nos remetem à passagem de Ícaro. Às vezes, colegas competentes, capazes, permanecem a vida inteira como “aprendizes”, passivos e sem ousadia.
Existe um antigo ditado chinês que diz: “quando o discípulo está pronto o mestre aparece”.
Muitas pessoas passam dias, semanas, meses e anos da própria vida procurando o mestre. Ao encontrá-lo se entregam, mas terminam descobrindo que o mestre não é o ser perfeito que imaginaram – mas um homem igual a todos, cuja única função é dividir aquilo que aprendeu.
Ao se ver diante de uma pessoa com defeitos próprios, o discípulo sente-se roubado. Vem o desespero e o desejo de abandonar a busca – quando, na verdade, é assim que deve ser; pois é justamente a mudança de mestres que nos deixa livres para criarmos nosso próprio caminho.
Existe um ponto de equilíbrio em nosso processo de despertar que precisa ser conquistado. Um ponto em que nos permitimos enxergar além de nossa própria experiência, mas que amadurecemos essa visão através do trabalho para atingir novos estágios. A experiência humana é repleta de cumes de inspiração e quedas dentro da dura realidade, formando assim uma mistura harmoniosa para alçar voo em direção à grande liberdade interior, que nos traz infinitas possibilidades.
Retornando ao trágico relato de Ícaro, gostaria de lhes contar o que ocorreu após Ícaro cair ao mar...a continuação deste mito deveria ser como Ícaro ressurge do mar Egeu, vivo, após conhecer Poseidon, Senhor dos mares, tio de Apolo (o próprio Sol) e este lhe conta como ir até a morada de Apolo sem ajuda de máquinas ou artifícios.
Ícaro ousou.

Ricardo Santos de Oliveira
Presidente SBN-Ped